Todos os anos, a Pastoral do Trabalhador da Arquidiocese do Rio de Janeiro distribuiu uma carta aberta aos trabalhadores pelo Dia do Trabalho, também pela festa de São José Operário. Confira a íntegra da carta deste ano:
Neste 1º de maio, festa de São José Operário, queremos saudar os trabalhadores e trabalhadoras, bem como reafirmar o compromisso com a DIGNIDADE e a GRANDEZA da pessoa humana e do trabalho.
Este ano a Campanha da Fraternidade nos traz um tema, fraternidade e vida: dom e compromisso com seu lema: viu, sentiu compaixão e cuidou dele, que nos dá a oportunidade de olharmos para a realidade do mundo do trabalho a partir da atitude revelada pela parábola do Bom Samaritano. Somos todos convidados, governantes e povo em geral, a priorizar o BEM COMUM e não os interesses mesquinhos dos que só se preocupam consigo mesmos em busca de vantagens pessoais ou de grupos. Viver a experiência da fraternidade e valorização da vida, é assumir que todos somos de fato irmãos e a vida é primordial e deve ser defendida em todos os seus aspectos. Para muitos parece que pouco importam a vida e a dignidade das pessoas. Pensar na fraternidade e na vida como dom e compromisso, é assumir que como dom deve ser acolhida e como compromisso deve ter o empenho de todos e de cada um de nós. É ação que deve estar presente em toda a sociedade a atitude de ver com um olhar de solidariedade as muitas situações de sofrimento, sentir compaixão, isto é, deixar que seu coração seja tocado e agir para garantir que se promova «o conjunto das condições de vida social que permitem aos indivíduos, famílias e associações alcançar mais plena e facilmente a própria perfeição» (Gaudium et spes, 74).
Somos todos a chamados ser expressão da caridade de Cristo que vê para além das aparências e circunstâncias e viver o modo de ser do Bom Samaritano. Recordar o esforço dos trabalhadores por melhores condições de vida no mundo do trabalho é estar atento aos grandes desafios desta parcela da humanidade. Como nos lembra o Documento de Aparecida, «são os leigos, conscientes de seu chamado à santidade em virtude de sua vocação batismal, os que têm de atuar à maneira de um fermento na massa para construir uma cidade temporal que esteja de acordo com o projeto de Deus» (n. 505). Isto é ser uma Igreja Samaritana.
Diante das últimas tragédias experimentadas em nossa cidade e pelo país, quer provocadas pelos temporais ou outros desastres humanos, como negar a quantidade de pessoas que perdem a vida, os seus empregos, o direito à moradia digna, à saúde e à educação por conta da corrupção, dos desvios de recursos públicos e do desmando das classes governantes? Diante da pandemia do covid19 que ceifa a vida e as esperanças e traz incertezas para todos, Como olhar e passar adiante como se não tivéssemos a ver com a realidade? Mas, são anos de olhar e passar adiante sem sentir compaixão da dor e sofrimento de muitos irmãos nossos que vivem as muitas situações que se acumulam e repetem de mazelas em nossa sociedade. A saúde relegada muitas vezes a segundo plano, apresenta, agora, durante a crise do covid 19 a sua fragilidade. E a economia que diante da crise, também, não consegue se manter ativa e apontar um futuro. Tudo isso corrói a esperança e a vida, acentuando o clima de violência, insegurança e desamparo na vida de tanta gente!
Quando abandonando a lei do amor, nada se faz, acabamos por se afirmar a lei do mais forte sobre o mais fraco. O pecado habita no coração do ser humano (cf. Mc 7, 20-23) e se manifesta como avidez, ambição desmedida de bem-estar, desinteresse pelo bem dos outros. Leva à exploração da criação (pessoas e meio ambiente), gerando aquela ganância insaciável que considera todo o desejo um direito e que, mais cedo ou mais tarde, acabará por destruir inclusive quem está dominado por ela.
Em nosso país não é diferente. A ganância, a ambição e a corrupção fazem surgir a cada época novas formas de acumulação e especulação. A compra da consciência das pessoas faz com que aqueles que deveriam proteger a população e legislar em favor do bem comum acabem, muitas vezes, ajudando a perpetuar e fortalecer uma sociedade com estruturas injustas e desumanas que corroem e destroem a vida das famílias.
É a manifestação da dureza de coração, que concentra a riqueza e é causa da miséria de muitos. Como seria bom se todos, seguindo o exemplo do divino Mestre, que “não veio para ser servido, mas para servir” (Mt 20,28), buscassem uma participação mais ativa na sociedade como forma concreta de amor ao próximo, que permita a construção de uma cultura fraterna baseada no direito, na justiça e no bem comum!
Precisamos, no entanto, acreditar que através da nossa união, fé, amor, oração, coragem, comprometimento, diálogo, comunhão e revisão da realidade conseguiremos gerar uma nova realidade.
Não podemos e nem devemos ficar à margem da busca pela justiça. Ao contrário, devemos nos empenhar na edificação da paz neste nosso mundo marcado por muitas violências e guerras, e, hoje de modo particular, pelo terrorismo, a corrupção e a exploração sexual (Bento XVI, Exortação Apostólica pós sinodal Sacramento da Caridade ,78-88).